Um estudo realizado pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), em parceria com o Departamento de Biologia da Universidade de Aveiro, põe em evidência os efeitos da reintrodução do lince-ibérico (Lynx pardinus) no Vale do Guadiana sobre a população de raposas.
Usando foto-armadilhagem e radiosseguimento, o estudo, conduzido ao longo de cinco anos, identificou os efeitos da nova população de linces sobre as raposas, bem como os mecanismos de coocorrência.
Os resultados revelam um decréscimo contínuo da abundância de raposa nos territórios ocupados por linces, apesar de esta abundância ter grandes flutuações, com aumentos no outono devido à incorporação de juvenis nas populações. Estimou-se que, ao longo dos cinco anos a população de raposa decresceu cerca de três vezes.
O estabelecimento de uma nova população de um predador de topo, como o lince-ibérico, pode causar ajustamentos demográficos e ecológicos na comunidade de predadores generalistas, quer ao nível do comportamento, quer ao nível da abundância. Estes efeitos potenciais poderão ser mais evidentes na população de raposas, dado que é o carnívoro mais abundante e com uma alimentação similar à do lince. Neste contexto, estudaram-se os potenciais efeitos da presença de lince-ibérico ao nível da segregação do espaço, padrões de atividade diária e abundância das populações de raposa.
O regresso do lince-ibérico a novos territórios não deverá provocar uma extinção local nas populações de raposa, mas sim uma redução da sua abundância e a adoção de estratégias defensivas que permitam a co-ocorrência. A manutenção de uma densidade adequada de raposas é importante para o equilíbrio do ecossistema, tendo em conta o papel deste predador enquanto regulador de populações de roedores.
Este estudo também enfatiza que em áreas de ocorrência e de reprodução de lince-ibérico, as técnicas de controlo de predadores, efetuadas nos processos de gestão de coutos de caça, poderão não ser necessárias, tendo em conta o efeito regulador da espécie sobre potenciais competidores. Esta análise é concordante com outras conduzidas em Espanha, demonstrando que a reintrodução do lince-ibérico, ao reduzir a abundância de outros predadores, contribuiu para uma redução de cerca de 56% na taxa de predação sobre coelho-bravo, acabando por se revelar benéfica para a gestão cinegética.